NÃO SOMOS APENAS 60% »
Há aproximadamente 21 anos, a Polícia Federal vem tentando administrar uma questão bastante indigesta, que é a divisão interna entre as classes, notadamente os delegados de um lado e os demais no outro. Para os mais novos, estou me referindo à questão da isonomia salarial, conquistada pelos delegados de polícia na atual Constituição da República.
Já naquela ocasião, ficou visível o pensamento dominante de uma classe sobre as demais, pois nada foi feito então para buscar melhorias para os "subalternos" da polícia. E quando falo em polícia estou me referindo a todas as polícias,
mas pretendo centrar nesta humilde exposição as questões da Polícia Federal.
Quem não se lembra daquele período, quando durante cinco ou seis anos os "doutores" desfrutavam de suas férias na Europa ou no Caribe, enquanto nós, a plebe, no máximo, conseguíamos passar o final de semana em uma "sanga"
dessas que ficam próximas às cidades. Quem não se lembra quando o desconto previdenciário de um "doutor" era maior que o salário de um agente ou escrivão. Quem não se lembra da famosa e maldita frase que escutávamos de nossas chefias: "fiquem tranqüilos, que assim que a isonomia for concretizada nós iremos arrumar o lado de vocês".
Pois bem, quem tanto apanha, um dia se levanta. E foi assim que surgiu o movimento sindical, que por ser perseguido e pressionado pelas chefias, se tornou forte e organizado o suficiente para "parar" o DPF em nossas greves.
Naquelas ocasiões, a luta foi centrada na busca da PROPORCIONALIDADE salarial entre delegados e demais classes, pois uma legislação vigente estabelecia um parâmetro de 60% entre o salário destes e dos agentes, escrivães e
papiloscopistas.
Por mais absurdo que possa parecer nos dias atuais, essa luta e conseqüente conquista representaram um aumento salarial em torno de 400%, com o restabelecimento da proporcionalidade. Passaram-se os anos, a Polícia Federal evoluiu para patamares de Primeiro Mundo. Conseguimos, após muita briga, transformar toda a categoria em nível superior (apesar da posição, como sempre, contrária de nossos "chefes doutores"), o que sem dúvida alguma melhorou em muito a qualidade de nossos quadros.
É chegado o momento de trazer à discussão uma questão que vem nos inquietando atualmente, principalmente no momento em que assistimos outras categorias do serviço público federal atingirem níveis salariais melhores, e nós,
policiais federais - gradativamente - estamos indo parar no final da fila, quando o assunto é salário.
O que estamos ouvindo em nossas bases é uma contestação à questão do 60%. Mesmo respeitando uma posição dentro de um contexto de uma época, hoje não mais nos consideramos 60%. O trabalho realizado por agentes e escrivães (nem
menciono os papiloscopistas, pois esses, merecidamente, em breve se tornarão peritos criminais), está no mesmo nível daquele desempenhado pelos delegados.
Ou alguém duvida que os escrivães dominam um inquérito policial com a mesma desenvoltura dos delegados? Ou que os agentes atuam com a mesma desenvoltura que os delegados nas grandes investigações/operações, que tanta visibilidade dão ao trabalho da Polícia Federal.
Nas mais diversas atribuições do DPF, o nível do trabalho desempenhado é altamente qualificado, e merece ser melhor valorizado. Ao contrário da classe dominante, nós queremos melhorias para todos. Queremos que o delegado de Polícia Federal ganhe sempre o teto salarial, e se possível que ultrapasse esse teto, mas merecemos valorização pelo nosso trabalho.
Com base em uma bandeira dos incompetentes, somos barrados sob o pretexto de "quebra de hierarquia" quando buscamos melhorar nossa posição. Quem não se lembra do atual "farrapo" de projeto de Lei Orgânica, quando buscamos
avançar um passo (salário final de agentes, escrivães e papiloscopistas equivalente ao de um delegado de 2ª Classe). Ocorreu uma histeria geral entre a classe dominante, a bandeira dos incompetentes tremulou com tanto vigor que a Direção Geral, mais uma vez, só deu ouvidos para uma das classes, esquecendo que o DPF é uma mão com cinco dedos (DPF, PCF, PPF, EPF e APF), e que cada um desses "dedos" tem a sua parcela para que o tão venerado inquérito policial atinja seu objetivo final.
Não tenho a fórmula para atingir nosso objetivo, mas acho que é o momento de levantarmos essa bandeira, buscar idéias junto a nossas bases (enviem sugestões ao seu sindicato, pressionem os dirigentes sindicais para buscarem mecanismos para montar essa "bandeira"), e quando chegar a hora vamos todos nos unir em torno dessa questão. Se necessário for, vamos pressionar as chefias, não vamos buscar viagens "papa diária", não vamos realizar as investigações que dão origem às mega-operações (sabemos que na sua maioria são resultado do empenho pessoal e além do exigível de um grupo de investigadores).
o delegado de sua delegacia vier com aquela antiga conversa dizendo que apóia a nossa reivindicação, vamos filmar isso, tirar fotografias, colher assinatura dele em um manifesto, pois estamos cansados de sermos iludidos com tapinhas nas costas e palavras amistosas, e na hora de encaminhar alguma coisa surge a ADPF barrando qualquer avanço. Será que a ADPF é uma entidade ditatorial? Acho que não, pois realizam eleições periódicas, e tenho certeza que representam, e muito bem, os interesses dos delegados de Polícia Federal.
Não pode uma entidade de classe, que representa apenas um segmento da Polícia Federal, ser a única ouvida e atendida pela Direção Geral. Eu, como muitos que já trabalharam no passado diretamente com o senhor Diretor Geral, soubemos que ele pensa como nós, mas é refém de uma classe, que bem ou mal ajuda na sua administração. Mas assim como o DPF tem vários projetos visando o futuro da instituição, é o momento de incluir também projeto visando diminuir esse injusto "fosso salarial" e acabar de vez com o absurdo argumento de quebra de hierarquia.
Companheiros, vamos levar adiante essa idéia, vamos falar em todo canto deste país, em cada delegacia e cada setor, que NÃO SOMOS 60%, trabalhamos bem mais que isso e merecemos valorização.
Um forte abraço a todos os colegas.
* Nívio Boelter Braz é agente de Polícia Federal com 28 anos de serviços no DPF, bacharel em direito e ciências contábeis, lotado na DPF Santo Ângelo/RS.
Fonte: Agência Fenapef
Últimas Notícias
O SINPEF/MS defende os direitos dos policiais federais